Corrupção nazista: como Hitler comprou os generais
A falta de transparência das ditaduras anda de mãos dadas com a corrupção. Para se manter no poder, Hitler corrompeu oficiais graduados das forças armadas.
Aparentemente, nazistas e militares eram um casamento perfeito. Ambos queriam uma vingança contra a humilhação do Tratado de Versalhes, que desarmou a Alemanha após a Primeira Guerra. Com isso, acertar as contas com a inimiga dessa guerra, a França, e expandir o domínio da Alemanha pela Europa e pelo mundo. Ambos queriam uma ditadura militarista. E antissemitismo, se não exatamente um valor central à vida militar alemã, certamente não era impedimento.
Mas as forças armadas alemãs eram conhecidas por ser “um Estado dentro do Estado”. Ninguém menos que Otto von Bismarck, o chanceler considerado fundador da Alemanha Unificada, foi proibido de atender a reuniões do Supremo Conselho de guerra, por ser considerado civil. Os dois últimos anos da Primeira Guerra foram basicamente uma ditadura militar, num golpe silencioso por conta da incompetência que os militares viam no imperador Guilherme II e seu chanceler, Theobald von Bethmann-Hollweg. Era o “duumvirato” do marechal Hindenburg e ggeneral Ludendorff. Hinderbug acabaria por ser o homem a dar o cargo de chanceler a Hitler, em 30 de janeiro de 1933, selando o destino da Alemanha.
Mas, ao final do dia, Hitler continuava a ser um mero cabo plebeu, quando os oficiais graduados vinham da nobreza alemã – classe extinta com o fim da monarquia, mas obviamente na memória de seus membros. Diante de suas atrocidades – em vários casos, mais pelo desperdício de recursos que questão humana – e de sua condução desastrada e intempestiva da guerra, Hitler não pôde contar com a fidelidade incondicional de todos os militares. Antes mesmo de começar a guerra, já havia uma conspiração marcada para dar um golpe militar, a Conspiração Oster, liderada pelo general Hans Oster, que pretendia mater Hitler e restaurar o imperador Guilherme II para impedir que a Alemanha causasse outra guerra mundial. Estava para começar após a invasão da Checoslováquia, que podia precipitar a guerra – e fracassou porque o primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, deixou de graça, com Hitler ganhando as notícias como “exímio estadista”.
ENTRA O SUBORNO
Antes da guerra, e mais ainda durante, Hitler passou a molhar a mão dos oficiais com presentinhos como propriedades, carros, vultosos cheques e a liberação de impostos. Havia um fundo secreto para isso, chamado Konto 5 (“Conta 5”), que começou em 150 mil reichsmarks (RM) em 1933 (US$ 901.815,32 em dinheiro de hoje), e terminou em RM 40 milhões em 1945. Oficiais ganhavam de RM 2 mil a RM 4 mil “por fora”, mais RM 250 mil no aniversário, para um salário de RM 24 mil de um general.
Hitler fazia questão de deixar claro que aquilo não era uma coisa oficial, mas um presente pessoal dele, mais ou menos ilegal, e que podia ser tirada a qualquer instante. Era uma forma de tornar a pessoa cúmplice num acordo desonroso, e dever fidelidade direto ao Fuhrer, não ao Estado. E funcionava: em julho de 1942, quando o marechal de campo Fedor von Bock, comandante de grupos importantes de exército nas invasões da Polônia, França e URSS, foi sacado de sua posição, a primeira coisa que perguntou é se continuaria a receber os cheques. Ao final, Hitler conseguiu prosseguir em sua campanha militar cada dia mais suicida. A tentativa de assassinato que sofreu em 20 de junho de 1942 partiu de uma minoria, e a razão maior era justamente que o país estava perdendo a guerra. Nenhum oficial ativo importante estava envolvido – Erwin Rommel, que seria eventualmente forçado a se suicidar em outubro de 1944, até onde se levantou, sabia do plano e fez vistas grossas, mas sua participação ficou no “apoio moral”.
Militares alemães, como os do resto do mundo, gostavam de se apresentar como uma reserva moral da nação. Mas, com uma generosa dose de suborno, foram dobrados a participar das atrocidades (e participaram, principalmente durante a invasão da URSS) e levar seu país à ruína. As forças armadas alemãs limpinhas, sem envolvimento nos crimes nazistas, é um mito do pós-guerra, de quando oficiais veteranos foram re-recrutados para as Bundeswehr, forças da Alemanha democrática, em 1955, e os EUA olharam para o outro lado porque os ex (ou “ex”) nazistas eram adversários dos soviéticos.