Tulipamania: a primeira bolha financeira, estourada por uma epidemia

Era a flor do inimigo: a tulipa foi trazida à Europa do Império Otomano, pelo trabalho do embaixador Ogier Ghiselin de Busbecq (1522-1592), do Sacro-Império Romano-Germânico. Era a época do sultão Solimão, o Magnífico (1494-1566), que conquistou múltiplos territórios cristãos, quando os dois impérios se enfrentavam nas chamadas Guerras Italianas. Busbecq ficou encantado pelas cores extremamente vívidas da flor, e mais ainda por tê-la visto florescendo quase na metade do inverno, quando nenhuma outra flor se abria.

A tulipa se espalharia pelo continente e se tornaria um símbolo de status por toda a Europa. Adaptou-se bem às terras baixas da Holanda e se tornaria um grande negócio no país. Ao longo da década de 1630, a moda pegou. A demanda e o valor da planta começaram a subir vertiginosamente.

Isso é possível porque a tulipa é um “bem durável”: ela se propaga por bulbos, que parecem com cebolas. Esses bulbos podem ser preservados entre uma florada e outra, e as plantas vivem por muitos anos, levando cinco até começarem a dar flor. As mais raras e valiosas variedades de tulipa, que ganhavam nomes portentosos como Alexandre Magno e Almirante van der Eijck, eram as atingidas pelo vírus mosaico, benigno, mas que faz com que tenham mais de uma cor. Isso não pode ser reproduzido por sementes – o vírus só passa entre bulbos. Assim, uma tulipa rara não era algo fácil de copiar.

Em 1635, um lote de 40 bulbos de tulipa foi vendido por 100 mil florins – equivalente, pelo cálculo do Instituto Internacional de História Social, de Amsterdã, a € 1.115.000,00 (onze milhões e cento e quinze mil euros, equivalentes a R$ 6.032.150,00). Uma única Tulipa da variedade Vice-Rei podia comprar 5 casas em Amsterdam.

O auge da tulipamania, como seria conhecida a primeira bolha especulativa da história, foi entre 1636 e 1637. Pessoas que não tinham nada que ver com o negócio, como agricultores comuns, fabricantes de tecidos, chegando até a limpadores de chaminé, começaram a comprar tulipas para vender mais caro depois, confiando que os preços iriam continuar a subir indefinidamente. A Holanda até mesmo acabou inventando o mercado de futuros: as pessoas compravam as plantas no meio da estação, antes delas darem flor, apostando que valeriam muito mais ao desabrochar.

Até fevereiro de 1637. Em um dia, o mercado de tulipas em Haarlem simplesmente ficou vazio. Ninguém apareceu. Não havia nenhuma flor para vender tampouco: estavam então todas em forma de bulbo, esperando para florescer em maio ou junho. A cidade passava por um surto de peste bubônica, e não era uma atividade segura. Mas a falta de pregão foi o bastante para estourar a bolha: o mercado da tulipa entrou em colapso.  Ninguém mais queria pagar o que havia sido acordado, e juízes determinaram aos produtores aceitarem receber 1/10 dos valores, porque era tudo dinheiro de “apostas”. Do dia para a noite, as tulipas passaram a valer tanto quanto… flores.

Para saber mais: o mais clássico relato da Tulipamania foi composto pelo jornalista escocês Charles Mackey em 1841. Historiadores modernos tendem a duvidar de suas afirmações mais extravagantes, como pessoas se suicidando em massa nos canais de Amsterdã. O valor máximo atestado em documentos foi de “apenas” uma casa. E a Holanda não parece ter sido arruinada: o tema foi tratado jocosamente no país, em canções e pinturas na época (como a que ilustra a matéria), o que não é uma atitude muito adequada quando seu vizinho se matou. Também lembram que a tulipa, um item de luxo difícil de copiar, não era realmente um investimento tolo.