Maná de São Nicolau: líquido dos ossos de Papai Noel é tido por remédio milagroso
São Nicolau, bispo grego do século 4, ficou famoso, entre várias outras ações, por dar presentes aos pobres. Em sua história mais famosa, salvou três moças pobres da prostituição ao dar o dinheiro para o casamento, secretamente, jogando bolsas com ouro pela janela. Daí a tradição dos presentes, que chegaria a hoje na forma modificada, secularizada e comercializada do Papai Noel (nome que vem do francês Père Nôel, “Pai Natal”, como é chamado em Portugal).
Em países ortodoxos, Nicolau continua a ser um santo altamente venerado e sério. No Ocidente, muito de sua influência vem de depois de sua morte. E o que acontece é que provavelmente não teríamos Papai Noel sem um roubo.
Em 1087, com conquistadores islâmicos do Império Otomano às portas, marinheiros italianos tomaram a maioria dos ossos de São Nicolau de sua igreja em Mira, Anatólia, sob protestos dos monges. Foram levados para Bari, na Itália, onde estão ainda hoje, na Basílica de São Nicolau. Outra parte, menor, seria tomada por venezianos, igualmente sem autorização, durante a Primeira Cruzada, em 1100, e estão no Monastério de São Nicolau, Veneza. Em Mira, resta a tumba vazia e a igreja, desativada em 1923, é hoje um museu. Outras relíquias menores estão espalhadas por igrejas pelo resto do mundo.
ESSÊNCIA DE PAPAI NOEL
Desde os tempos bizantinos, aos ossos de São Nicolau é atribuído um milagre peculiar: eles emitiriam um líquido milagroso. É o Maná de São Nicolau, historicamente descrito como um óleo perfumado mas que, por análises químicas autorizadas pela Igreja Católica em 1925, é basicamente água pura transparente. Cerca de 50 ml são produzidos por ano, e coletados solenemente pela Igreja no Dia da Translação, 5 de maio, quando chegaram ali em 1087. A Basílica de São Nicolau de Bari afirma não saber se o líquido sai dos ossos ou da tumba e as hipóteses mais científicas falam em mera infiltração, o que a Igreja nega.
O líquido é misturado com água benta e engarrafados em frascos, disponíveis aos fiéis. Esses fracos podem ser simplesmente guardados mas, desde sempre, várias curas são atribuídas aos que passam no corpo ou bebem a essência dos ossos de São Nicolau.
Os indícios são de que os ossos em Veneza e Bari são mesmo os da figura histórica que nasceu e morreu em Mira. Ou ao menos quem estava enterrado lá na Idade Média. Em 1957, os ossos em Bari foram exumados e amplamente estudados, enquanto os de Veneza o foram em 1992. A conclusão é que provavelmente são da mesma pessoa e que essa pessoa morreu com mais de 70 anos. Ainda não existia datação por radiocarbono.
O culto a São Nicolau se tornou firme no Centro e Norte da Europa, por influência de cruzados germânicos passando por Bari. Nesses países, os presentes eram trocados no Dia de São Nicolau: 6 de dezembro, quando ele faleceu em Mira, em 343. Em outros países, como Portugal, o santo continuou pouco celebrado.
Nicolau começou a “degenerar” em Noel por influência da Reforma Protestante, que tentou suprimi-lo com os demais santos. Foi Martinho Lutero quem sugeriu mudar a celebração para o Natal em si. Na Inglaterra, o nome do santo foi suprimido, no lugar entrando a figura de Father Christmas, o “Pai Natal”, conhecido por Santa Claus nos EUA por conta da colônia holandesa, que o chama de Sinter Klaaas – apelido de Niklaaas (Nicolau). O Brasil herdara de Portugal a ausência de tradições ligadas a São Nicolau e o conheceu já nessa forma.