Flashback https://flashback.blogfolha.uol.com.br Tudo é história Thu, 27 Aug 2020 19:18:00 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 É na guerra que se muda de general, Maia! https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/10/guerra-muda-general/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/10/guerra-muda-general/#respond Fri, 10 Apr 2020 22:02:14 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/mcarthur-1.jpg https://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=452 O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, afirmou em uma entrevista à Rádio Bandeirantes que acredita que o presidente Jair Bolsonaro e seu ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, estejam a caminho de se entender, apesar da insubordinação do segundo ao plano/ideologia presidencial. Afirmou que Bolsonaro é militar e sabe que “no meio da guerra, mudar o general quatro estrelas não é o melhor momento”.

O nerd de história aqui ficou com seu radiador fervendo. E nem é sobre política, mas pela falta de lógica na frase que sabe-se lá de onde ele tirou. É justamente na guerra que se muda general, deputado! Devia ser óbvio. Na paz, um general incompetente pode bem ficar jogando bocha no quartel. Em guerra, a incompetência de um general leva à derrota e à mais completa ruína.

Quando um general é incompetente, pode acabar morto em campo de batalha, como Marco Licínio Crasso, membro do Primeiro Triunvirato que dominou de Roma, eliminado tolamente na Batalha de Carras, contra os partas, em 53 a.C. Outros preferem se retirar, como o também romano Varus, derrotado na Batalha da Floresta de  Teutoburgo (9 d.C.), ou o francês Pierre-Charles Villeneuve, perdedor da Batalha de Trafalgar (1805). Ambos preferiram se matar a enfrentar a reação em casa.

Porque a reação acontece. Em 106 a.C., Quinto Servílio Cepião foi condenado ao exílio e perda de cidadania romana por sua derrota em Aráusio, no ano anterior, que custara até 120 mil vidas romanas. Na Guerra Civil Americana, Lincoln teve que sacar George McClellan do comando, em 1862, por simplesmente se recusar a atacar. Na Primeira Guerra, a França passou por três comandantes: Joseph Joffre, removido por uma fragorosa derrota da Romênia em dezembro de 1916, Robert Nivelle, tirado em abril de 1917 pelo fracasso da ofensiva que leva seu nome, e, por fim, Philippe Pétain, com quem o país venceria, mas que, já velhinho, na Segunda Guerra, teria a desonra de atuar como o presidente marionete da França ocupada dos nazistas. Falando em Segunda Guerra, os soviéticos simplesmente executaram seu comandante da fase inicial, Dmitry Pavlov (ainda que alguns digam que Stalin estava só achando um bode expiatório). Na Guerra da Coreia, Douglas McArthur, visto como o grande vencedor do Teatro do Pacífico na Segunda Guerra, foi removido do cargo por insistir em querer escalar a guerra a ponto de planejar um ataque nuclear por conta.

E por aí vai. Em guerra, não existe essa conversa”estabilidade” – para que serviria estabilidade no caminho da derrota?

E aqui talvez aqui haja algo a dizer sobre a política de Maia – mas não estou pensando em Mandetta.

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Quantos Stalin matou? https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2019/07/22/quanto-stalin-matou/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2019/07/22/quanto-stalin-matou/#respond Mon, 22 Jul 2019 22:15:37 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2019/07/stalin-300x215.png http://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=62 Livros ainda serão escritos sobre como o número de pessoas mortas por um premiê soviético se tornou tema de disputa política no Brasil. Se você perguntar à internet brasileira, a resposta varia entre “pouco” e “100 milhões” ou mais.

Mas este é um caso peculiar em que, se a mesma pergunta for feita a historiadores profissionais, a resposta será quase tão discrepante quanto. Os neostalinistas (raros no Ocidente, em ascensão na Rússia) vão falar em menos de 100 mil, e relativizar mesmo esses números. Do outro lado, já se falou em até 110 milhões – pelo escritor e historiador dissidente Alexander Soljenítsin, em 1975, logo após ser expulso da União Soviética.

Um número assim não é levado mais a sério hoje em dia. Mas foi bastante circulado durante a Guerra Fria, quando acadêmicos ocidentais confiavam no testemunho e estatísticas produzidas por dissidentes. Por exemplo, o historiador americano Rudolph Rummel, em 1990, publicou sua estimativa de 51,5 milhões de mortes no período Stalin.

Após a queda do regime soviético, em 1991, os arquivos da inteligência soviética foram abertos e os historiadores puderam finalmente contar com números oficiais. E esses números acabaram parecendo modestos em comparação. São eles:

  1. Execuções políticas (1929-1953): 777.975
  2. Mortes nos gulags (campos de trabalhos forçados): entre 1,5 e 1,7 milhões
  3. Mortos no reassentamento dos kulaks (proprietários de terras): 389.521
  4. Mortos em outros reassentamentos: 309.521
  5. Mortos na Grande Fome da Ucrânia (Holodomor): mínimo 1,8 milhões, máximo 6,7 milhões (pesquisa pelo historiador australiano Stephen G. Wheatcroft; já se chegou a falar até em 20 milhões).

Total: 3,2 – 9,9 milhões.

Em sua forma bruta, esses números não são aceitos por ninguém. Entre outras coisas, está em disputa se a fome da Ucrânia foi mesmo uma política deliberada de extermínio por Stalin, com o governo do país adotando como posição oficial que foi um genocídio. Historiadores variam entre concordar ou considerar o desastre resultado da coletivização agrícola de Stalin e/ou também problemas climáticos. Neostalinistas não só descontam o Holodomor, como afirmam que as mortes nos Gulags foram naturais em sua maioria e que os números de execuções listados pela NKVD foram inflados. Mais comum é ir na direção oposta, argumentando que os números oficiais certamente ficam aquém da realidade, com execuções e mortes nos gulags subnotificadas.

Noves fora, no que pode ser considerado mainstream hoje, Stalin foi responsável pela morte de algo entre 9 milhões (Oleg Khlevniuk, da Universidade de Moscou, uma das maiores autoridades da Rússia atual) a 20 milhões ou mais (o historiador britânico Simon Sebag Montefiore, autor das recentes biografias de Stalin e Lenin). Na média, 15 milhões é um número frequentemente citado.

Sejam 3, 9, 15 ou 20 os milhões de Stalin são menos do que se ouve por ai, mas ainda muita, muita gente. E, já que ninguém vai resistir à tentação de comparar com Hitler, o número desse fica entre 10 milhões e 25 milhões. Mas isso não conta a Segunda Guerra na Europa, que ele causou, e custou mais uns 35 milhões, pelo menos.

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