Flashback https://flashback.blogfolha.uol.com.br Tudo é história Thu, 27 Aug 2020 19:18:00 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Corrupção nazista: como Hitler comprou os generais https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/06/25/corrupcao-nazista-como-hitler-comprou-os-generais/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/06/25/corrupcao-nazista-como-hitler-comprou-os-generais/#respond Thu, 25 Jun 2020 14:39:25 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2020/06/konto.png https://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=537 A falta de transparência das ditaduras anda de mãos dadas com a corrupção. Para se manter no poder, Hitler corrompeu oficiais graduados das forças armadas.

Aparentemente, nazistas e militares eram um casamento perfeito. Ambos queriam uma vingança contra a humilhação do Tratado de Versalhes, que desarmou a Alemanha após a Primeira Guerra. Com isso, acertar as contas com a inimiga dessa guerra, a França, e expandir o domínio da Alemanha pela Europa e pelo mundo. Ambos queriam uma ditadura militarista. E antissemitismo, se não exatamente um valor central à vida militar alemã, certamente não era impedimento.

Mas as forças armadas alemãs eram conhecidas por ser “um Estado dentro do Estado”. Ninguém menos que Otto von Bismarck, o chanceler considerado fundador da Alemanha Unificada, foi proibido de atender a reuniões do Supremo Conselho de guerra, por ser considerado civil. Os dois últimos anos da Primeira Guerra foram basicamente uma ditadura militar, num golpe silencioso por conta da incompetência que os militares viam no imperador Guilherme II e seu chanceler, Theobald von Bethmann-Hollweg. Era o “duumvirato” do marechal Hindenburg e ggeneral Ludendorff. Hinderbug acabaria por ser o homem a dar o cargo de chanceler a Hitler, em 30 de janeiro de 1933, selando o destino da Alemanha.

Mas, ao final do dia, Hitler continuava a ser um mero cabo plebeu, quando os oficiais graduados vinham da nobreza alemã – classe extinta com o fim da monarquia, mas obviamente na memória de seus membros. Diante de suas atrocidades – em vários casos, mais pelo desperdício de recursos que questão humana – e de sua condução desastrada e intempestiva da guerra, Hitler não pôde contar com a fidelidade incondicional de todos os militares. Antes mesmo de começar a guerra, já havia uma conspiração marcada para dar um golpe militar, a Conspiração Oster, liderada pelo general Hans Oster, que pretendia mater Hitler e restaurar o imperador Guilherme II para impedir que a Alemanha causasse outra guerra mundial. Estava para começar após a invasão da Checoslováquia, que podia precipitar a guerra – e fracassou porque o primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, deixou de graça, com Hitler ganhando as notícias como “exímio estadista”.

ENTRA O SUBORNO

Antes da guerra, e mais ainda durante, Hitler passou a molhar a mão dos oficiais com presentinhos como propriedades, carros, vultosos cheques e a liberação de impostos. Havia um fundo secreto para isso, chamado Konto 5 (“Conta 5”), que começou em 150 mil reichsmarks (RM) em 1933 (US$ 901.815,32 em dinheiro de hoje), e terminou em RM 40 milhões em 1945.  Oficiais ganhavam de RM 2 mil a RM 4 mil “por fora”, mais RM 250 mil no aniversário, para um salário de RM 24 mil de um general.

Hitler fazia questão de deixar claro que aquilo não era uma coisa oficial, mas um presente pessoal dele, mais ou menos ilegal, e que podia ser tirada a qualquer instante. Era uma forma de tornar a pessoa cúmplice num acordo desonroso, e dever fidelidade direto ao Fuhrer, não ao Estado. E funcionava: em julho de 1942, quando o marechal de campo Fedor von Bock, comandante de grupos importantes de exército nas invasões da Polônia, França e URSS, foi sacado de sua posição, a primeira coisa que perguntou é se continuaria a receber os cheques. Ao final, Hitler conseguiu prosseguir em sua campanha militar cada dia mais suicida. A tentativa de assassinato que sofreu em 20 de junho de 1942 partiu de uma minoria, e a razão maior era justamente que o país estava perdendo a guerra. Nenhum oficial ativo importante estava envolvido – Erwin Rommel, que seria eventualmente forçado a se suicidar em outubro de 1944, até onde se levantou, sabia do plano e fez vistas grossas, mas sua participação ficou no “apoio moral”.

Militares alemães, como os do resto do mundo, gostavam de se apresentar como uma reserva moral da nação. Mas, com uma generosa dose de suborno, foram dobrados a participar das atrocidades (e participaram, principalmente durante a invasão da URSS) e levar seu país à ruína. As forças armadas alemãs limpinhas, sem envolvimento nos crimes nazistas, é um mito do pós-guerra, de quando oficiais veteranos foram re-recrutados para as Bundeswehr, forças da Alemanha democrática,  em 1955, e os EUA olharam para o outro lado porque os ex (ou “ex”) nazistas eram adversários dos soviéticos.

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Stalin criou a teoria da conspiração de que Hitler sobreviveu https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/30/stalin-criou-a-teoria-da-conspiracao-de-que-hitler-sobreviveu/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/30/stalin-criou-a-teoria-da-conspiracao-de-que-hitler-sobreviveu/#respond Thu, 30 Apr 2020 23:16:50 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/HitlerEva-3.jpg https://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=472 A história real não é consenso: Hitler se matou com uma cápsula de cianureto seguida por um tiro na têmpora em algum momento entre as 15h e 16h de 30 de abril de 1945. Seu corpo foi levado à saída do bunker e cremado a céu aberto, depois cremado mais um pouco e enterrado numa cova rasa numa cratera de explosão de artilharia soviética. Em 1º de maio, os alemães ouviram pelo rádio que Adolf Hitler estava morto e o almirante Karl Dönitz assumiria como presidente. No dia seguinte, as forças alemãs em Berlim se renderiam. A rendição final, de forças além de Berlim, só viria dia 8.

Desde a descoberta, o destino dos restos de Hitler ficou com os soviéticos. No dia 4 de maio, os restos de Hitler, Eva Braun, Blondi, a pastora alemã de Hitler, e outro cachorro não identificado foram encontrados pelo comandante soviético Ivan Klimenko. Eles foram levados ao centro de contra-inteligência (Smersh) no dia seguinte. Stalin desconfiou que seria um casal de impostores e restringiu toda informação. No dia 11, com a ajuda dos assistentes de seu dentista e seus registros, os soviéticos identificaram os restos como de Hitler. A mandíbula e os dentes que serviram de identificação foram enviados a Moscou, o resto, enterrados numa floresta em Brandenburgo.

Stalin aceitou a verdade. E passou a dizer que era mentira, declarando sua teoria pela primeira vez na Conferencia de Potsdam, em julho, que seria, por anos, a versão oficial soviética: Hitler havia fugido para a Argentina ou Espanha, com a ajuda dos Aliados ocidentais. O líder soviético, assim, é a origem das teorias da conspiração que circulam ainda hoje. Ainda em 1947, uma pesquisa revelava que a maioria dos americanos acreditava que Hitler estava vivo.

Os países ocidentais, que haviam replicado o comunicado dos alemães e aceito sua versão, ordenaram uma investigação ainda em novembro de 1945, que concluiu que era verdade: Hitler estava morto. Continuaram a realizar buscas até os anos 1950 e nenhuma revelou Adolf comendo alfajor em Buenos Aires.

Mas a pergunta é: o que Stalin queria com isso? Ele nunca explicou e historiadores discutem ainda hoje. Uma hipótese é que queria minar o apoio dos outros países à Espanha e Argentina, na qual o fascismo seguia vivo. Outra é que a ideia de Hitler vivo mantinha também vivo o espírito de ameaça que manteve o moral alto na guerra. E uma possibilidade bem mais mesquinha é que fosse uma rixa com o Marechal Georgy Jukov, chefe das forças soviéticas, que havia sido alçado à posição de herói nacional por seu sucesso. Jukov chegou a dizer aos aliados que o corpo de Hitler fora encontrado, para tomar uma bronca de Stalin e ser forçado a aderir à versão oficial.

Os exumaram os restos de Brandenburgo em fevereiro de 1946, quando partes do crânio foram enviadas a Moscou, onde estão hoje tudo o que restou de Hitler. O que sobrou foi reenterrado em outro local secreto em Magdeburgo. Em 1970, numa operação secreta, foram exumados mais uma vez, cremados, moídos, e jogados no Rio Biederitz. O plano de não haver sepultura pra Hitler evitar criar um santuário para neonazistas. E os soviéticos estavam certos: foi exatamente o que aconteceu com Mussolini.

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75 anos: Mussolini pendurado no posto de gasolina https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/28/mussolini-cabeca-para-baixo-posto-gasolina/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/28/mussolini-cabeca-para-baixo-posto-gasolina/#respond Tue, 28 Apr 2020 22:11:48 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/Mussolini_e_Petacci_a_Piazzale_Loreto_1945.jpg https://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=467 A foto é brutalmente simples em sua mensagem: o ditador Benito Mussolini, que prometia ressuscitar o império Romano e se tornou um fantoche de um descendente dos bárbaros, terminava sua carreira pendurado pelos pés, como um porco no açougue.

Mussolini, oficialmente primeiro-ministro, governou a Itália entre 31 de outubro de 1922 e 25 de julho de 1943, quando, após a incursão aliada na Itália, foi deposto e preso. Em 23 de setembro de 1943, os nazistas os tiraram da prisão numa operação secreta. Então foi feito líder da República Social Italiana, também chamada República de Saló, por sua capital, uma pequena vila com esse nome na Lombardia, norte do país. Era a parte da Itália ainda controlada pelos nazistas, na qual aquele que havia inspirado Hitler agora era seu capacho.

O corpo na foto de 28 de abril de 1945 estava irreconhecível. Mas isso foi no pós-morte: ele havia sido deixado na Piazalle Loreto, praça próxima à estação central de Milão, e brutalizado pela multidão, que jogou vegetais, pedras, urinou e chutou os corpos dele e de sua amante, Claretta Petacci. Na madrugada do mesmo dia, havia sido executado a tiros de submetralhadora pelo partisan (membro das resistência) comunista Walter Audisio, após um julgamento sumário, ou, por algumas versões, nem isso: o líder partisan Urbano Lazzaro, que não estava presente na cena, mas a investigou posteriormente, afirmava que simplesmente haviam sido mortos quando Petacci tentou roubar uma arma de um partisan.

Seja lá como Mussolini tenha sido despachado, esse foi só o começo de uma longa e mórbida aventura pós-morte. Às 14h do mesmo dia, os americanos tiraram os corpos do posto de gasolina e os levaram para autópsia. Então, um fotógrafo militar capturou outra imagem, em cores, dos corpos de Mussolini e Petacci posando de braços dados. A foto é brutal demais para publicar sem aviso (e a que ilustra a matéria já é meio demais), então vai via link, clique aqui por conta e risco –dá para ver claramente o estrago na face do ditador. Os americanos testaram o casal para sífilis, que acreditavam poder ter causado sua “loucura”, mas deu negativo. O ditador foi enterrado numa cova não marcada num cemitério da cidade.

Em 21 de abril de 1946, domingo de Páscoa, pouco menos de um ano após sua morte, o corpo de Mussolini foi escavado pelo fascista Domenico Leccisi. E começou uma caçada por seu corpo, mudado de lugar em lugar, até ser “capturado”, em agosto do mesmo ano, num mosteiro Certosa di Pavia, perto de Milão. Faltava uma perna. Dois monges foram acusados de conspirar com o fascista.

O cadáver então movido, secretamente, para outro mosteiro, em Cerro Maggiore, e lá permaneceria até 19 de maio de 1957, quando assumiu como primeiro-ministro italiano o democrata cristão Adone Zoli. Ele havia sido partisan na guerra, mas então ascendera com apoio parlamentar da extrema direita –incluindo nada menos que Leccisi, o exumador, agora senador. Como concessão, o corpo foi devolvido para a família e enterrado em 1º de setembro na vila de Predappio, local de seu nascimento. Até hoje, um mausoléu com símbolos fascistas e uma tumba de pedra marcam ostensivamente o local. Todo dia, até centenas de fascistas convergem para fazer “turismo” na tumba, com 28 de abril marcando o auge.

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É na guerra que se muda de general, Maia! https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/10/guerra-muda-general/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2020/04/10/guerra-muda-general/#respond Fri, 10 Apr 2020 22:02:14 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/mcarthur-1.jpg https://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=452 O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, afirmou em uma entrevista à Rádio Bandeirantes que acredita que o presidente Jair Bolsonaro e seu ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, estejam a caminho de se entender, apesar da insubordinação do segundo ao plano/ideologia presidencial. Afirmou que Bolsonaro é militar e sabe que “no meio da guerra, mudar o general quatro estrelas não é o melhor momento”.

O nerd de história aqui ficou com seu radiador fervendo. E nem é sobre política, mas pela falta de lógica na frase que sabe-se lá de onde ele tirou. É justamente na guerra que se muda general, deputado! Devia ser óbvio. Na paz, um general incompetente pode bem ficar jogando bocha no quartel. Em guerra, a incompetência de um general leva à derrota e à mais completa ruína.

Quando um general é incompetente, pode acabar morto em campo de batalha, como Marco Licínio Crasso, membro do Primeiro Triunvirato que dominou de Roma, eliminado tolamente na Batalha de Carras, contra os partas, em 53 a.C. Outros preferem se retirar, como o também romano Varus, derrotado na Batalha da Floresta de  Teutoburgo (9 d.C.), ou o francês Pierre-Charles Villeneuve, perdedor da Batalha de Trafalgar (1805). Ambos preferiram se matar a enfrentar a reação em casa.

Porque a reação acontece. Em 106 a.C., Quinto Servílio Cepião foi condenado ao exílio e perda de cidadania romana por sua derrota em Aráusio, no ano anterior, que custara até 120 mil vidas romanas. Na Guerra Civil Americana, Lincoln teve que sacar George McClellan do comando, em 1862, por simplesmente se recusar a atacar. Na Primeira Guerra, a França passou por três comandantes: Joseph Joffre, removido por uma fragorosa derrota da Romênia em dezembro de 1916, Robert Nivelle, tirado em abril de 1917 pelo fracasso da ofensiva que leva seu nome, e, por fim, Philippe Pétain, com quem o país venceria, mas que, já velhinho, na Segunda Guerra, teria a desonra de atuar como o presidente marionete da França ocupada dos nazistas. Falando em Segunda Guerra, os soviéticos simplesmente executaram seu comandante da fase inicial, Dmitry Pavlov (ainda que alguns digam que Stalin estava só achando um bode expiatório). Na Guerra da Coreia, Douglas McArthur, visto como o grande vencedor do Teatro do Pacífico na Segunda Guerra, foi removido do cargo por insistir em querer escalar a guerra a ponto de planejar um ataque nuclear por conta.

E por aí vai. Em guerra, não existe essa conversa”estabilidade” – para que serviria estabilidade no caminho da derrota?

E aqui talvez aqui haja algo a dizer sobre a política de Maia – mas não estou pensando em Mandetta.

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É verdade que poloneses atacaram tanques com cavalos na Segunda Guerra? https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2019/09/03/e-verdade-que-poloneses-atacaram-tanques-com-cavalos-na-segunda-guerra/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2019/09/03/e-verdade-que-poloneses-atacaram-tanques-com-cavalos-na-segunda-guerra/#respond Tue, 03 Sep 2019 21:02:24 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2019/09/1081px-Winter_Horse_Face_Portrait-300x215.jpg https://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=223 Não. Mas atacaram alemães com cavalos. Foi um sucesso.

A imagem meio quixotesca, meio ignóbil de poloneses enviando cavaleiros contra tanques, pra bater com suas espadas contra a blindagem, foi uma invenção da propaganda nazista, inspirada em estereótipos nos quais o polonês figura em piadas de gente estúpida e atrasada (“Quantos poloneses precisa pra trocar uma lâmpada? Três: um segura a lâmpada, dois giram a escada”). Inspirada numa história real, na qual eles foram os perdedores.

O que realmente aconteceu é que, no exato primeiro dia da guerra, ao fim da tarde, o 18o Regimento de Ulanos (cavalaria leve) viu uma oportunidade perto da vila de Krojanty. Um grupo de infantaria alemã descansava desavisado numa clareira. Não havia blindados nem ninhos de metralhadoras à vista, o que fazia daquilo um conflito pré-Primeira Guerra. A carga começou às 19h.

Ulano polonês
Ulano polonês em 1938 (Foto: Domínio Público)

Uma carga de cavalaria não é algo a ser subestimado. Um grupo de homens montados em alta velocidade, cortando seus companheiros a torto e direito com sabres – e também atirando sem dar chance – é algo aterrorizador. Um choque moral garantido, que funcionou então como havia funcionado por toda a história: os alemães saíram correndo para a floresta.

Teria sido pior para os alemães se os cavaleiros poloneses não fossem surpreendidos por um grupo de blindados leves que estava próximo. Não tentaram nada, bateram em retirada. E, ainda assim, para se ter uma ideia do poder de metralhadoras contra cavalos, um terço da tropa foi eliminada, inclusive o comandante, Eugeniusz Świeściak.

Mas não foi em vão: o ataque atrasou os alemães o suficiente para a infantaria polonesa conseguir se retirar em segurança.

Hussardo polonês
Hussardo polonês, considerado a mais eficiente cavalaria de sua época, em quadro de 1810 (Aleksander Orlowski/Domínio Público)

No dia seguinte, correspondentes alemães vieram a campo e viram cavalos e cavaleiros poloneses mortos, ao lado de tanques alemães, que haviam chegado depois da batalha. Assim nasceria a lenda.

CAVALOS EM AÇÃO

Mas há alguns detalhes que ficam fora da história: os poloneses portavam, de seus cavalos, fuzis antitanque, capazes de penetrar a blindagem dos tanques alemães ainda primitivos usados em 1939. Também estavam em processo de mecanização – os poloneses tinham 210 tanques no começo da guerra. Nem de perto o suficiente para fazer frente aos 2750 dos alemães, mas não era um exército napoleônico, enfim.

Por fim, algo que você nunca viu em filmes: cavalos fizeram parte da Segunda Guerra. Eram usados principalmente para puxar peças de artilharia, mas também para observação. A Alemanha mesma usou 2,75 milhões deles ao longo guerra (a União Soviética empregaria outros 3,5 milhões). Inclusive estavam lá na invasão da Polônia:

Cavaleiros alemães na invasão da Polônia
Alemães montados na Polônia, 1o de setembro de 1939 (Foto: Bundesarchiv)

A última carga de cavalaria bem-sucedida seria na Segunda Guerra. Foi em 1o de março de 1945, na vila de Schoenfeld. Uma posição de artilharia antitanque alemã foi destruída por ninguém menos que os poloneses – o que certamente dá um sabor especial à história toda.

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Núcleo Demônio: como a terceira bomba atômica do Japão matou sem nunca explodir https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2019/08/21/nucleo-demonio-como-a-terceira-bomba-atomica-do-japao-matou-sem-nunca-explodir/ https://flashback.blogfolha.uol.com.br/2019/08/21/nucleo-demonio-como-a-terceira-bomba-atomica-do-japao-matou-sem-nunca-explodir/#respond Wed, 21 Aug 2019 18:57:59 +0000 https://flashback.blogfolha.uol.com.br/files/2019/08/Wellerstein-TheDemonCore1-300x215.jpg https://flashback.blogfolha.uol.com.br/?p=194 Quando Fat Man explodiu sobre Nagasaki, em 9 de agosto de 1945, não havia nenhuma garantia de que o Japão se renderia. De fato, a expectativa era lançar até uma dúzia de bombas, a próxima muito provavelmente destinada a Tóquio, dia 19, as outras em setembro ou outubro. O núcleo da bomba do dia 19, que nunca ganharia nome, era composto por duas semi-esferas e um anel de plutônio, diferente do núcleo da Fat Man nesse último detalhe. Estava pronto para ser instalado no resto da bomba quando veio a notícia, dia 15, da rendição japonesa. Mas essa peça de destruição em massa, frustrada sua função inicial, ainda teria um destino, que renderia a ela, um nome bem mais adequado que o “Menininho” e o “Homem Gordo” das bombas que caíram: Núcleo Demônio.

Com o fim da guerra, o núcleo foi redestinado a mais pesquisas no Laboratório de Los Alamos, o principal centro do Projeto Manhattan. Havia muito ainda a ser descoberto sobre energia nuclear, inclusive seu possível uso civil. E foi assim que, em 21 de agosto de 1945, menos de uma semana após o fim da guerra, o cientista Harry Daghlian estava testando colocar blocos de carbeto de tungstênio em volta dela. O composto é capaz de refletir nêutrons emitidos pelo núcleo, e, ao atingi-lo pela reflexão, mantém uma reação nuclear. A ideia era saber como fazer obter uma reação com menos material radioativo, por meio dessa reflexão.

Demon Core teste Daghlian
Recriação do teste de Daghlian (Foto: Governo dos EUA/Domínio Público)

Daghilian foi adicionando bloco a bloco até o último, quando o medidor revelou que isso poderia levar o núcleo a um estado supercrítico, uma reação nuclear autossustentada – morte certa para ele. E, de puxar o tijolo na pressa, esse escorregou da sua mão, caindo direto no núcleo, que entrou em estado crítico imediato. O cientista então tentou tirar o tijolo, sem sucesso, e teve que desmontar toda a pilha. Em meio a isso, recebeu uma dose de 5,1 Sievert (Sv) de radiação – 45 vezes o nível médio recebido pelos liquidadores de Chernobyl, 0.12 sV. Com as mãos queimadas, por 25 dias, ele agonizaria de síndrome de radiação aguda, que basicamente faz uma pessoa se decompor em vida (como visto na série da HBO).

Mão de Harry Daghlian
Mão de Harry Daghlian, queimada por radiação (Foto: Governo dos EUA/Domínio Público)

A CAUDA DO DRAGÃO

Exatos 9 meses depois, 21 de maio de 1946, outro cientista, Louis Slotin, fazia um teste semelhante com o Núcleo Demônio. Desta vez, o que refletia os nêutrons eram duas semi-esferas de berílio em volta do núcleo. A reação supercrítica começaria se elas fossem fechadas.

Se Daghilian era cuidadoso – e errou ao ser cuidadoso –, Slotin era um famoso bravateiro, andando em jeans de cowboy, quando isso era visto como coisa de cowboy.  Fazia seus experimentos, contrário a qualquer procedimento de segurança, com uma chave de fenda. A chave, manuseada em sua mão esquerda, era tudo o que impedia as esferas refletoras de se fecharem. Já havia feito a brincadeira diante de várias plateias de cientistas, desafiando seu medo. Isso havia levado a Enrico Fermi, um dos principais cientistas do Projeto Manhattan, a prever que estaria morto em um ano. O que ele fazia era, lembrando a frase do outro cabeça do projeto, Richard Feynman, “fazer cócegas no rabo de um dragão dormindo”.

Demon Core Teste Slotin
Recriação do teste fatal de Slotin (Foto: Governo dos EUA/Domínio Público)

É previsível como termina: o dragão acordou quando a chave escorregou para fora do espaço entre as semi-esferas refletoras. Ao se tocarem, um clarão azul visível foi provocado. Como Daghlian, Slotin teve o senso de parar a reação, enfiando de volta a chave de fenda e jogando a parte de cima do refletor para o chão. Havia recebido uma dose de 21 Sv. Agonizaria por nove dias.

Fora os dois cientistas imediatamente responsáveis, o núcleo pode ter matado mais três pessoas, mas é difícil averiguar. Robert J. Hemmerly, o soldado que fazia a guarda para Daghilian, e a única testemunha do primeiro experimento, morreria de leucemia em 1978. Das sete testemunhas do segundo experimento, o físico Marion Edward Cieslicki morreria também de leucemia, em 1965, e o fotógrafo David Smith Young, de anemia aplástica, que pode ser relacionada a exposição a radiação, em 1975.

O Núcleo Demônio estava destinado a explodir na Operação Crossroads, o famoso teste do Atol de Bikini. Mas, dada sua mais que comprovada insegurança, foi derretido para ser usado em outras armas nucleares. Se acabou explodido num teste ou ainda está por aí, reciclado ou perdido num depósito de material nuclear tirado de bombas obsoletas desativadas, ninguém sabe.

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